Que tal mais um café
Pedi mais um café, queria terminar meu livro em
paz, já são quase onze horas a senhora me olha como se fosse um aviso
"esse é o último, já vamos fechar" a quanto tempo eu estou nessa
rotina? acho que talvez uns seis meses ou mais, dou um gole preciso me aquecer
antes de enfrentar a noite fria. Estou gelada por dentro, mais um gole, o café
faz cocegas na minha garganta e parece se misturar ao meu sangue, deixou uma
nota dobrada sobre a mesa, perto de um jarro de flores vagabundas, é apenas a
forma que encontrei de agradecer aquela companhia silenciosa. Vou até o caixa
vagarosamente, espero que os minutos se arrastem com meus passos, pago, recebo de volta alguns trocados que coloco no bolso do casaco sem
conferir, me despeço com um aceno leve da cabeça, a porta faz um
barulho ranzinza quando puxo como se reclamasse por
que alguém ainda estava ali.
A chuva fina caia do
céu numa tentativa frustrada de molhar o me agasalho vou andando devagar pelas
ruas mal iluminadas encontrando uma vez ou outra algum desconhecido, fico
imaginando se ele estivesse na mesma situação que eu. Encontro a chave com os
dedos trêmulos de frio e abro o portão, subo dois lances de escadas
até chegar ao pequeno apartamento, olhando para ele a cafeteria parecia muito
mais aconchegante, nesses trinta metros quadrados estavam escondidos todos os
meus medos e monstros, conseguia ver claramente eles se
espremendo entre as mobílias, ou no lustre da
sala, debaixo das mesas.
Será que estava ficando
louca? Fui até a cozinha na esperança de encontrar algo para comer, o
tempo que tenho passado aqui é bem pouco por isso a casa
já começou seu protesto silencioso e estava criando uma camada
de poeira por tudo que estava espalhado pela casa. Encontrei um suco
em caixa e alguma comida congelada, comecei a trabalhar naquilo e por
alguns instantes minha mente ficou mais leve, no final do processo tinha uma
refeição até que apresentável, me sentei entre as almofadas e comecei a
parte mais dolorosa do processo - comer- não sentia vontade
nenhuma.
Mentia pra todos que me
perguntava, como eu estava, as pessoas sabiam demais, queriam demais de mim,
verifiquei minhas contas e cheguei à conclusão que precisava trabalhar
novamente, afinal daqui a um tempo elas não se pagariam sozinhas. Sentia um
vazio tão grande dentro de mim, mesmo tento uma vida considerada boa e um
padrão que muitos considerariam feliz, mas as vezes não sei o que pensar ou até
mesmo fazer, tomei meus remédios, ignorei todas as minhas mensagens, por
um momento vi um dos meus monstros se aproximando de mim, aquele
já era uma velha companhia, fiz carinho na sua cabeça e ela se sentou ao meu
lado como se ficasse de sentinela, adormeci e a minha companhia foi a
solidão.
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